Os altos
índices de criminalidade e de estupros, a disseminação das drogas, a violência
nas manifestações de rua, a corrupção disseminada, para não citar que alguns
fenômenos sociais patológicos, indicam que a sociedade brasileira está numa era
de transição.
Para
onde?
Maquiavel, em
sua História de Florença, comparando-a com eventos passados, concluiu que as
sociedades mal ordenadas, injustas, oscilam entre a servidão e a licenciosidade.
A servidão é sinônimo de Ditadura, o
pior dos regimes. Aos cidadãos, transformados em servos, é imposto um governo que
impera baseado na força e não nas leis. A licenciosidade, a anarquia, é
caracterizada pelo regime no qual os cidadãos não respeitam as leis, aspirando
por uma liberdade sem qualquer restrição. É o caldo de cultura ideal para os
demagogos, isto é, os chefes de partidos populares (origem do termo na Grécia
Antiga), mestres no uso da retórica, na magia das palavras, para iludir as
massas.
Tal parece ser o caso do Brasil: transitou da
Ditadura para a forma mais degenerada de Democracia, a conduzida por demagogos
(Aristóteles). Nesta condição, instalou-se a licenciosidade, manifestada pelos
fenômenos apontados acima. Portanto, seguindo o raciocínio do sábio
renascentista, a sociedade brasileira estaria em transição para uma Tirania.
Qual forma de Tirania? A resposta de Platão não pode ser mais clara: um
“salvador da pátria” seria entronizado. Assim, a forma de Tirania seria a do
governo de um Só, nos moldes de Mussolini ou Salazar. Na Roma Antiga, foram
inúmeros os golpes dos legionários ou da guarda pretoriana. Já tivemos um
precedente recente. Haveria condições de recidiva? No imaginário da classe
média superior existe o desejo. O trauma pelo fracasso da experiência dos guardiões
armados do Estado estaria superado ou “gato escaldado tem medo de água fria”?
Em função do
“background” nacional, julgamos que estes são os cenários mais prováveis: um
longo período de licenciosidade, com o aprofundamento da barbárie, da anomia,
beirando a “guerra de todos contra todos” (Hobbes) ou a Tirania, de um Só ou de
uma burocracia (ou uma mescla dos dois).
Atualmente, a hegemonia ideológica da elite
governante brasileira pode ser
caracterizada pelo modelo cristão-marxista. Estão embutidos nestas duas visões de mundo, de configuração totalizante, os “ovos de serpente” da licenciosidade e o da Ditadura (“do proletariado” /do partido/do culto de personalidade).
caracterizada pelo modelo cristão-marxista. Estão embutidos nestas duas visões de mundo, de configuração totalizante, os “ovos de serpente” da licenciosidade e o da Ditadura (“do proletariado” /do partido/do culto de personalidade).
A
ideologia cristã - desconsiderando as questões relacionadas à fé-, seria a de
“perdedores”, na avaliação de valores do filósofo alemão Nietsche. Privilegiaria
aos "pobres", aos "enfermos" e aos "pecadores".
Uma vez delineado este arcabouço teórico de caráter ideológico, agora estamos
aptos para ilustrá-lo na prática.
O “carro-chefe” dos
programas do governo é o famoso “Bolsa-Família”, direcionado aos “pobres”. Isto
se traduz na postura assistencialista oficial de transferência de renda para as
camadas mais baixas da escala social-iniciada pelo “Fome-Zero", de
iniciativa da Igreja. No discurso religioso trata-se do sinal do maná, “o
verdadeiro pão que vem do céu”(6,32-33). O antropólogo francês Marcel Mauss
escreveu um ensaio sobre a dádiva, em que analisa as mais antigas relações de
troca nas sociedades. Um dos exemplos que cita é o do “dom” (potlatch), que
quer dizer, essencialmente, dádiva e alimento. Estabelece-se uma forma arcaica
de contrato, em que o presente recebido é obrigatoriamente retribuído. A dádiva
implica necessariamente a instalação de crédito. O “dom” é mais que uma troca:
é um fenômeno religioso, mitológico e xamanístico. Há necessidade de
caracterizar, ainda mais, uma das
principais virtudes cristãs, a da
caridade? (“quem dá aos pobres empresta a...”).
A ideologia cristã tem grande influência sobre a
aplicação do código penal da sociedade. A postura diante do criminoso, do
fora-da-lei, do “marginal”, é a do excluído, do explorado. Estimula uma atitude
tíbia diante do crime, escorada na
"recuperação" do malfeitor, sinônimo de "pecador", merecedor da misericórdia e do
perdão. O menor pode cometer todas as infrações "de maior", no entanto, a elite governante recusa-se a rever a maioridade penal. Há uma epidemia de ódio, de crime e de violência no país e os governantes não ousam contrariar a ideologia do “amor ao inimigo”...
"recuperação" do malfeitor, sinônimo de "pecador", merecedor da misericórdia e do
perdão. O menor pode cometer todas as infrações "de maior", no entanto, a elite governante recusa-se a rever a maioridade penal. Há uma epidemia de ódio, de crime e de violência no país e os governantes não ousam contrariar a ideologia do “amor ao inimigo”...
Quanto aos "enfermos" aí está o Sistema Único de Saúde,
garantindo a prestação da assistência à saúde de forma universal e igualitária.
A ideologia cristã marcou o advento da igualdade entre os homens, o fim da
escravidão na Antiguidade. O programa "Mais Médicos", procura
estender este direito até os mais distantes recônditos do país. Os médicos foram,
e não por acaso, importados da Ilha
Socialista.
Neste ponto, torna-se possível estabelecer uma ponte com a outra
ideologia dominante da casta dirigente, a marxista.
A curiosa coincidência é que o marxismo também pode ser
considerado uma crença, semelhante a uma religião. Citemos a interpretação de
Karl Löwith, em “Significado e Fim da História”: “É somente na consciência
‘ideológica’ de Marx que toda história é a história das lutas de classe,
enquanto a real força condutora por detrás desta concepção é um transparente
messianismo que tem sua raiz inconsciente no próprio ser de Marx, mesmo em sua
raça. Ele era um Judeu de estatura do Velho Testamento, embora um Judeu
emancipado do século dezenove que era fortemente antirreligioso e mesmo
antissemita. É o velho messianismo e profetismo judaico -inalterado por dois
mil anos de história econômica de trabalho manual à indústria de larga escala- e a insistência
judaica na absoluta retidão que explicam a base idealista do materialismo de
Marx. Embora pervertido em previsão secular o Manifesto
Comunista ainda conserva as características básicas da fé messiânica: ‘ a
certeza das coisas aguardadas’..o proletariado como povo eleito que conduz à
redenção”.
Pode-se,
porém, imaginar um cenário mais “róseo”: nos interstícios institucionais e na
falência da ordem da sociedade atual pode estar em gestação a criação de um
“admirável mundo novo”. Estabeleçamos que já exista alhures: nos países
nórdicos da Europa (Suécia, Noruega, Dinamarca, Finlândia). São modelos
híbridos, associando o Estado e o Mercado, numa combinação mais harmoniosa,
temperada.
O grande historiador Ferdinand
Braudel dizia que a vida nos países emergentes (para usar o vocabulário atual)
era um Purgatório ou um Inferno.
Suponhamos que estejamos numa encruzilhada: o
Céu ou o Inferno será o Destino brasileiro?
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